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Florestas aqui, fazendas lá

Deu na Folha de São Paulo de hoje (21/06/2010) a reportagem de Claudio Angelo "Proteger floresta no Brasil faz bem para a agricultura dos EUA" (https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2106201002.htm) que mostra o estudo "Farms here, Forest there: Tropical Deforestation and U.S. Competitiveness in Agriculture and Timber" elaborado por David Gardiner e Shari Friedman. 

O título do estudo pode ser traduzido como Fazendas aqui (nos EUA), florestas lá (nos países tropicais): Desflorestamento nos trópicos e competitividade norte-americana na agricultura e na madeira.

O relatório pode ser baixado da página da Avoided Deforestation Partners clicando em http://adpartners.org/pdf/ADP_Report_052410a.pdf


Uma das conclusões do relatório é que a proteção de florestas e a redução do desmatamento nos países tropicais (Brasil incluído) pode favorecer a economia norte-americana. É um bom argumento para os empresários e políticos de lá para protegerem o nosso ambiente. Segundo Angelo: "O objetivo do documento, lançado no fim de maio pela ONG Avoided Deforestation Partners, é convencer senadores dos EUA ligados ao agronegócio, a aprovarem a lei de mudança climática em tramitação no Senado. A lei prevê que os EUA possam negociar créditos de carbono ilimitados pelo desmatamento tropical evitado. Ou seja, o país pagaria para manter a floresta em pé no Brasil, por exemplo, e poderia abater o carbono que seria emitido pelo desmate das próprias metas de corte de poluição. O Brasil tem se oposto nas negociações internacionais a permitir que a redução no desmate possa gerar créditos ilimitados."

Mas esse relatório está sendo usado por políticos ruralistas e latifundiários brasileiros para justificar a revisão do Código Florestal Brasileiro. Veja que por exemplo a reportagem foi republicada em diversos sites ligados ao agrobusiness como o portal Agrolink e o PorkWorld, portal da suinocultura brasileira.

Na reportagem de Claudio Angelo aparecem as opiniões de dois representantes de grandes ONGs ambientalistas:

Paulo Adário, do Greenpeace, diz que usar a pesquisa como subsídio para mudar a lei brasileira seria ruim para a bancada ruralista pois o estudo tem problemas sérios. O principal é não levar em conta que reduzir o desmate não diminui a fronteira agrícola brasileira. Adário diz que "Só na Amazônia você tem 20 milhões de hectares de terras degradadas e abandonadas. Quando você para de desmatar, as terras já abertas ganham valor".
Adário diz que um estudo de Gerd Sparovek, da ESALQ/USP, mostra como é possível dobrar a produção no Brasil só usando áreas abertas e com alta aptidão agrícola. E lembra que desde 2006 vigora uma moratória ao plantio de soja em áreas desmatadas na Amazônia, e nem por isso caíram a produção e a produtividade caíram, pelo contrário, neste ano ambas cresceram.
Para Roberto Smeraldi, da ONG Amigos da Terra Amazônia Brasileira, diz que o estudo faz projeções burras associando linearmente hectares de desmatamento com a produção. Para Smeraldi: "Assim, desconsidera que a determinante para a produção não é área e sim produtividade, especialmente nos países onde a produtividade média é baixa, o que é o caso das pastagens no Brasil."
Abaixo alguns trechos da reportagem da Folha:
- Estudo diz que americano pode ganhar até US$ 270 bi em 2030 com queda no desmate. O argumento é que a maior proteção às florestas prejudicará a produção de carne, soja, dendê e madeira em países como o Brasil. Isso levaria a um aumento dos preços e à abertura de um buraco na oferta, que seria preenchido pelos EUA.
- "Eliminar o desmatamento até 2030 limitará a receita para a expansão agrícola e para a atividade madeireira nos países tropicais, nivelando o campo de jogo para os produtores americanos no mercado global de commodities", afirma o estudo.
- O estudo corrobora a visão de que a conservação ambiental é uma desculpa dos países desenvolvidos para impor barreiras à agricultura do Brasil, mais competitiva.
- Tal visão permeia o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) que propõe reformar o Código Florestal reduzindo as áreas de mata protegidas em imóveis rurais. A proposta tramita numa comissão especial da Câmara dos Deputados.

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