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Dunga, o novo técnico da Seleção Brasileira













Foto de Antônio Vargas - 16.set.83/ Agência RBS./ Agência RBS.

"Toda criança é meio revoltada, e eu não era diferente. Lembro que, quando jogava no Ouro Verde, de Ijuí, chegava a ser meio birrento. Brigava sem razão, chegava atrasado. O treinador me ensinou a ter disciplina. Aprendi que, no futebol e na vida, é preciso ter uma postura firme e correta."

DUNGA
novo técnico da seleção brasileira

Reproduzido a Capa do caderno "Esporte" da Folha de São Paulo de domingo, 30 de julho de 2006.

O dono da bola

Como Dunga deixou de ser o garoto birrento de Ijuí para virar líder nos campos e ganhar posto de técnico da seleção

Temperamental desde a infância, ex-jogador só melhorou comportamento quando comandou time de futebol na adolescência

GUILHERME ROSEGUINI
PAULO GALDIERI

DA REPORTAGEM LOCAL

O homem eleito para substituir Carlos Alberto Parreira no comando da seleção nem sempre conseguiu a designação de líder com naturalidade.
Também penou na escola pelo mesmo estilo emotivo e brigador que hoje é apontado como trunfo na sua missão de reerguer o Brasil. E chegou a gerir uma equipe de futebol com 15 anos para provar que não era um aluno-problema.
Na infância e na juventude, o temperamento inflamável que marcou o sucesso profissional de Dunga causou-lhe alguns dissabores, de acordo com relatos de familiares e amigos que acompanharam sua jornada em Ijuí, cidade gaúcha de 80 mil habitantes onde nasceu.
O acervo de causos inusitados começa já nas primeiras manifestações de seu propalado espírito de liderança.
A mãe, Maria, conta que "Dunguinha" era temido pelos colegas desde os primeiros chutes nos campos de várzea. Não por falar grosso ou distribuir reprimendas aos garotos, todos na época com seis ou sete anos, mas por ser o único proprietário de um objeto indispensável para disputa. "O Dunga era o dono da bola. Quando se enfezava, acabava com o jogo. Tinha que ser do jeito dele. A gurizada tinha que segui-lo."
Bolas, aliás, nunca faltaram na casa da família. Carlos, avô paterno do agora treinador da seleção, atuou como goleiro em pequenas equipes. Outros sete tios enveredaram pelo futebol.
O pai de Dunga, Edelceu, também se arriscou nos gramados, exibindo um repertório parecido com o que depois consagraria seu caçula.
"Lembro que ele era o líder do time, bravo e reclamão. Não é difícil adivinhar a quem o Dunga puxou", relata Cesar Augusto Valduga, que jogou com Edelceu no Esporte Clube São Luiz, agremiação de Ijuí.
Esse espírito colérico, muitas vezes birrento, deixou Dunga em maus lençóis nos tempos escolares. Não que tivesse problemas com notas. Seus boletins no colégio Rui Ramos, onde estudou por cinco anos, registram médias que variam entre 60 e 80. Educação física era o ponto forte (conseguiu um 100 na quarta série). Educação artística, o fraco (teve conceito "regular" na quinta série).
O que chamava atenção dos docentes era o comportamento intempestivo. "Quando ele cismava com algo, ninguém tirava da cabeça. Para os professores da época, era um mau elemento", relata Dona Helianita, ex-diretora da escola Rui Barbosa, destino do ex-atleta quando tinha entre 13 e 14 anos.
Ela encampou a missão de tentar recuperá-lo. Amiga da família, acreditava que o garoto precisava ganhar uma missão de responsabilidade, alguma tarefa na qual pudesse desovar suas qualidades de comando.
Como a paixão pelo futebol já havia sido manifestada, Helianita colocou Dunga para administrar a equipe dente-de-leite da instituição. Era sua primeira experiência como gestor.
"Ele cuidava dos garotos e até das contas do time. Aos poucos, melhorou bastante, deixou de ser disperso e conquistou a todos", conta a ex-diretora.
A experiência é lembrada até hoje pelo protagonista. "Era uma função importante, onde era preciso zelar pela união do grupo. Na época, aprendi que às vezes é preciso ceder para ganhar", afirma Dunga, 42.
Paralelamente à reviravolta que vivia na escola, o ex-jogador também chamava atenção pelo que fazia com a bola nos pés. Valdir Aguirre, falecido técnico que o comandava no Ouro Verde, achava que o pupilo merecia uma chance fora dos limites de Ijuí. Procurou então Emídio Perondi, padrinho de Dunga, e pediu para tentar uma vaga em um clube da capital.
"Fui ver um jogo dele e não gostei. De qualquer forma, levei-o para Internacional com 15 anos. Não demorou muito para eu saber que estava totalmente enganado", diz Perondi.
O sucesso meteórico -em 1982, apenas quatro anos depois de desembarcar no clube, Dunga ganhou o Estadual, seu primeiro troféu com os profissionais- acabou ofuscando o início difícil na nova casa.
Eram tempos bicudos. O agora treinador da seleção dormia com colegas em um alojamento improvisado embaixo das arquibancadas do estádio dos Eucaliptos. Os colchões eram colocados no chão. "Eu tinha um par de chuteiras, que usava nos jogos. Nos treinos, calçava um tênis Bamba", recorda Dunga.
Reclamações? Vontade de voltar para casa? De acordo com Perondi, jamais. "Não lembro de queixas. Ao contrário, dizia que sofrer era bom, que ajudava o homem a crescer. Ele segue essa filosofia até hoje. Vai causar impacto na seleção."

As mães são o meu exemplo, diz treinador

GUILHERME ROSEGUINI

DA REPORTAGEM LOCAL


Mamães, sensibilidade e combate à preguiça. Dunga nunca treinou uma equipe profissional, mas já tem na ponta da língua os preceitos que devem norteá-lo no comando da seleção. Na noite de anteontem, ele conversou com a Folha, por telefone.

FOLHA - Suas qualidades de líder sempre são exaltadas por quem atuou ao seu lado como jogador. Em quem você se espelha?
DUNGA
- Não fico procurando exemplos na política nem no esporte. Me espelho mesmo é nas mães. Quem tem paciência pra agüentar filhos, marido, trabalho, brigas internas e consegue apaziguar as coisas? Quem sabe a hora de puxar as orelhas no momento certo? Quem fica feliz com o sucesso dos outros? Só as mães. São verdadeiras líderes, e podemos aprender com elas lições que podem ser transportadas para o cotidiano do futebol.

FOLHA - Ao anunciar sua contratação, a CBF informou que buscava um técnico vibrante, motivador. Mas só isso basta na seleção?
DUNGA - Tudo é importante. Acredito que a sensibilidade é algo fundamental. É preciso conhecer bem cada jogador, para saber em que momento é preciso fazer cobranças ou elogios, para ter em mente quem pode brilhar, quem pode resolver a situação nos momentos complicados. Fui atleta e tive técnicos que sabiam sugar o que eu tinha de melhor. Eles me conheciam. Quero poder fazer o mesmo agora.

FOLHA - Você estréia no próximo dia 16, contra a Noruega. Já pensou em como motivar o grupo, especialmente após a malfadada campanha na Alemanha?
DUNGA - Estar na seleção já é uma motivação. Eu valorizo muito isso, talvez por não ter sido um craque. Sempre tive vontade de vencer. Quem ocupa um posto tão cobiçado deve ter a exata noção da importância do Brasil. Lembro de uma frase do Ricardo Rocha [zagueiro campeão do mundo em 1994] que acho muito interessante. Ele dizia "eu quero é entrar na banda, não importa o instrumento que vou tocar." Este espírito de entrega precisa existir.

FOLHA - Você sempre declarou gostar de treinar duro. Pretende tornar mais árduas as práticas da seleção, tão criticadas na Copa?
DUNGA - É preciso avaliar caso a caso. Não vou chegar agora e dar um treino de 3 horas só para dar resposta por causa do último Mundial. Os jogadores acabam de sair de férias, é um momento complicado. Mas, quando tiver tempo, aí seguirei as coisas em que acredito. Pô, 180 milhões querem jogar na seleção brasileira. Não pode haver preguiça. Com 14 ou 35 anos, nunca liguei de sair cedo da cama para treinar. Sacrifício momentâneo, satisfação duradoura. Os jogadores vão ter que entender isso.


Sobre o apelido:
ANÃO: APELIDO DE TÉCNICO FOI CRIADO NO BERÇO
Quando Carlos Caetano Bledorn Verri nasceu, em 1963, Emídio Perondi, seu padrinho, surpreendeu-se com o bebê atarracado, que tinha barriga protuberante e braços curtos. "Isso aí vai dar um Dunguinha", brincou. Dunga cresceu, alcançou 1,77 m, disputou três Copas como jogador. Mas o apelido nunca foi alterado.

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