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Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, Luis Fernando Veríssimo e filme Home


Nos últimos dias aconteceram coisas interessantes.

No início da semana, li um texto muito interessante do Luis Fernando Veríssimo chamado Evolução, escrito em 1976 e que já mostrava para onde a humanidade estava caminhando em termos de catástrofes ambientais, desigualdades sociais e maneiras bem-humoradas de tratar a questão (ver texto mais abaixo).

Ontem, assisti o filme Home, de Yann-Arthus Bertrand, com imagens belíssimas da natureza selvagem e de assentamentos humanos ao redor do mundo. Mas, também, com imagens de degradação ambiental decorrentes de mudanças climáticas, aquecimento global, industrialização, urbanização, e outros processos antropogênicos.

Além disso, Home apresenta vários dados como os seguintes: 20% da população do mundo consome 80% dos recursos disponíveis; uma em cada cinco pessoas utilizam a pesca como principal fonte de alimento; se gasta 12 vezes mais para fins militares do que para ajudar os países pobres; áreas protegidas cobrem mais de 13% dos continentes e isso que foram criados a menos de um século; um bilhão de pessoas não tem acesso a água potável; mais da metade dos grãos comercializados vira carne ou biocombustível..

Começo a preparar a apresentação do texto do Luis F. Veríssimo e descubro que hoje, 17 de outubro, é lembrado como o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza pela Organização das Nações Unidas (ONU), e ontem foi o Dia Mundial da Alimentação, promovido pela Food and Agriculture Organization (FAO), orgão que trata de alimentos e agricultura junto à ONU.

Cartaz do Dia Mundial da Alimentação (Imagine: Achieving food security in time of crisis ou Imagine: Alcançando a segurança alimentar em tempos de crises)



Cartaz do Dia Internacional para Erradicação da Pobreza
(We can en poverty together ou Nós podemos acabar com a pobreza juntos)

Eis o texto do Veríssimo transcrito:

"Evolução" - Luis Fernando Veríssimo

Os fracos herdarão a Terra, mas não no sentido que queria a Bíblia, como prêmio à humildade e à contemplação. É que só os miseráveis de hoje estão preparados para enfrentarem qualquer crise. Eles estão treinando há gerações.

Pense um pouco. Quem tem mais possibilidade de agüentar uma crise total de combustível? Os pedestres. É claro. Os carroceiros. Algumas tribos nômades. Você e eu, acostumados ao carro particular, ao táxi, ao ônibus seletivo e à carona – ao transporte automotor, enfim – não saberemos mais andar. Nós não somos automotores, nos habituamos a ser levados. Não teremos nenhuma chance contra quem se criou em filas do INPS e correndo para bater o ponto. Chegaremos, invariavelmente, por último, nos queixando dos calos.

E a crise de alimento? Quando só houver arroz, feijão e um pouco de farinha para cada cidadão, quem terá estômago para agüentar? Quem se acostumou desde pequeno, claro. Os subnutridos natos. Prevejo os hospitais cheios de novos-pobres sendo atendidos por saudáveis favelados.

- Tome a sua sopinha de aipim, vamos. O aipim é deste ano. Eu mesmo lavei.

- Argh!

- Hoje ela tem até um pouquinho de sal. Coragem...

As forças vivas de hoje serão os marginais de amanhã. Associações de lavadeiras farão chás de capim beneficentes em prol das damas de sociedade com insuficiência calórica. Ex-zeladores de carro darão pequenas gorjetas a executivos para ficarem cuidando das crianças enquanto eles saem para fazer biscates. Os líderes desta nova sociedade serão os catadores de lixo – ou Técnicos em Reciclagem, na nova nomenclatura. O que descobrir mais coisas reaproveitáveis no meio do lixo será aclamado Homem de Visão do ano, com direito a um carroção particular puxado por três parelhas de profissionais liberais.

Cada privação criará a sua elite. Com a falta de energia elétrica teremos a ascensão dos ladrões, acostumados a andar no escuro. A crise da habitação favorecerá os que vivem em baixo de pontes. Estes venderão seu know-how financiado, mas a correção monetária será demasiada e haverá uma onda de despejos, para dentro do rio. Comece, portanto, a tratar melhor os miseráveis. Dê altas esmolas. Corteje seus empregados. Seja caridoso. E se você é daqueles que dizem – “Não sei como essa gente consegue sobreviver” – procure descobrir e decore tudo. Para eles a crise sempre existiu. Eles têm uma prática!

VERÍSSIMO, Luís Fernando. O nariz e outras crônicas. 10ª ed., 3ª impres. São Paulo, Ática, 2002, 85-86. Publicado inicialmente em VERÍSSIMO, L.F. A Grande Mulher Nua. Rio de Janeiro, Ed. José Olympio, 1975.

Pois é, Luis Fernando Veríssimo e seu cenário de Evolução da civilização vem nos alertar para novas possibilidades de aprendizado e adaptação. Para finalizar, um mapa mostrando a fome no mundo em 2009.


Fonte das Imagens: Coração feito de alimentos; Cartaz FAO World Food Day 2009; Cartaz ONU International day for the eradication of poverty 2009; Mapa da fome no mundo 2009.

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